terça-feira, 15 de novembro de 2011

Flat out

Interlagos é uma pista legal. Bem exigente mas bastante segura tirando o setor do Café onde costuma morrer gente de vez em quando.

Só detalhe.

Corridas de carro são perigosas.

Mas Interlagos foi uma pista maravilhosa, já. De impor respeito em quem ia guiar lá. Tinha curvas de alta, o que já não tem mais.

O Expedito Marazzi classificava as curvas pela velocidade: baixa, até 100 km/h, média, entre 100 e 150 km/h e de alta velocidade, acima de 150 km/h.

A 1, a 2, o Sol e o Café eram de alta. O Café nem tanto porque era (ainda é) apenas uma reta torta.

As de alta eram foda. No seco, tudo bem. Fáceis de fazer flat out (pé pregado no assoalho, borboletas dos carburadores completamente abertas).

Mas na chuva...

Eu fui instrutor do Curso Marazzi de Pilotagem por muito tempo e gostava bastante de fazer isso. Sempre tinha alguma coisa a aprender com o Expedito. Fosse de corrida ou de vida. Era ótimo passar a tarde conversando com ele.

Numa quarta-feira chuvosa deixei meu Gol 1600 racer em casa e fui com um outro, igual mas não modificado pra enfrentar corridas.

Ninguém na pista. A chuva era forte. Bem paulista.

Na conversa agradável de sempre com o Expedito perguntei se era possível fazer a 1 flat de Gol 1600.

"Cadê teu carro?"

"Tá lá. Toma a chave."

A gente tinha isso em comum apesar da grande diferença de idade: a extrema falta de juízo. Não que fossemos completos idiotas, mas confiávamos ambos nos nossos respectivos tacos. Mas o Expedito tinha mais hora de vôo. Bem mais.

"Vou andar só no externo pra não perder muito tempo com isso."

"Faz como quiser, Expedito."

Todo mundo foi pra beira da pista na frente do último box (o mais perto da entrada da 1) pra ver o carro passando e principalmente escutar o motor. A gente sabe quando o piloto alivia o pé do acelerador mesmo que só um pouquinho. O ruído na altura dos filtros de ar diminui um pouco.

Na primeira passada, uma tiradona de pé. Já tinha gente querendo fazer aposta em grana. A chuva tava forte ainda.

Na segunda, uma tiradinha bem na hora de inserir o carro na trajetória, deslocando o peso pra frente e deixando a traseira solta. Do lugar que eu tava dava pra ver o Expedito virando suavemente a direção.

Ele sabia guiar.

Na terceira, quando deu pra ver a frente empinada do Gol 1600 passando pela linha de chegada, foquei no barulho dos carburadores. Naquele ponto da pista o Gol já vinha bem perto da sua velocidade máxima, com os dois Solex 32 engolindo bastante ar e fazendo um barulho maravilhoso.

Carburadores fazem um barulho lindo. Mesmo!

O Gol deslizou suavemente pra dentro da 1.

O barulho do motor não mudou até a saída da 2.

Missão cumprida. Dava pra fazer flat a 1 e a 2 com aquela quantidade de água.

Um minutinho depois entram no box o Gol e o Expedito. O Expedito com um sorrisão de orelha a orelha.

Típico dele.

"Dá sim!"

"Legal!"

Tinha uns quatro alunos e eu, lá. Todo mundo foi pra pista fazer a 1 flat.

Não sei (na verdade não lembro) se eles conseguiram.

Eu consegui. Várias vezes.

Mas é a mesma coisa que entrar correndo com os pés molhados num ambiente com o chão revestido de cerâmica ou madeira polida e encerada. Uma pequena bobeada e o escorregão é certo.

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